A possibilidade de conversão de licença a prêmio e férias não gozadas em dinheiro para os militares estaduais

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Entendem os Tribunais que o direito à conversão de período de licença e férias não gozadas em pecúnia origina-se, por certo, na aplicação do princípio básico do enriquecimento sem causa. Isto porque, entende-se que, ao abrir mão de suas férias e licenças, em proveito do serviço público, por necessidade de serviço, o militar passa a ter direito a sua indenização e negar-lhe esse direito significaria negar reparação do dano econômico sofrido pelo militar inativo em favor da Administração Pública que se enriqueceria indevidamente. (RSTJ 67/411; RSTJ 72/192 e RSTJ 72/204).

A propósito, vale lembrar a lição de YUSSEF SAID CAHALI (in “Responsabilidade Civil do Estado” 2a. ed., Malheiros, 1995, pág. 457/458): “Está definitivamente assentado na jurisprudência e mesmo nas esferas administrativas, o direito que tem o servidor de ser indenizado pelas férias e licenças-prêmios não gozadas em razão da necessidade de serviço. A indenizabilidade das férias e licenças-prêmios não gozadas em razão de interesse da Administração não implica conversão em pecúnia, mas reparação ao servidor, que, deixando de usufruir os dias de descanso a que fazia jus, permaneceu trabalhando em benefício do Estado”.

Esse também é o entendimento do STF manifestado em precedente firmado em julgamento de matéria repetitiva, cuja tese foi assentada no Tema no 635, “Conversão de férias não gozadas em indenização pecuniária, por aqueles que não mais podem delas usufruir, seja por conta do rompimento do vínculo com a Administração, seja pela inatividade, tendo em vista a vedação do enriquecimento sem causa pela Administração. Extensão do entendimento a outros direitos de natureza remuneratória não usufruídos no momento oportuno, a exemplo da licença-prêmio”, por oportunidade do julgamento do mérito do ARE 721001/RG, cujo paradigma restou assim ementado:

Recurso extraordinário com agravo. 2. Administrativo. Servidor Público. 3. Conversão de férias não gozadas – bem como outros direitos de natureza remuneratória – em indenização pecuniária, por aqueles que não mais podem delas usufruir. Possibilidade. Vedação do enriquecimento sem causa da Administração. 4. Repercussão Geral reconhecida para reafirmar a jurisprudência desta Corte.” (ARE 721001 RG, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 28/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-044 DIVULG 06-03-2013 PUBLIC 07-03- 2013).

Inicialmente, sabemos que o militar do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ) é regido pelo Estatuto dos Bombeiros-Militares, aprovado pela Lei nº 880, de 25 de julho de 1985 e a Polícia Militar respectivamente pelo Estatuto do Policial Militar na Lei n° 443, de 1º de julho de 1981.

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Os períodos de licença e férias não gozados são computados em dobro por ocasião da inatividade, com fulcro no §5º do Art. 58 e §3º do Art. 62, ambos da Lei Estadual nº 880, de 25 de julho de 1985, e com fulcro nos arts. 64 e 65 da Lei n° 443, de 1º de julho de 1981 in verbis:

Art. 58 – Férias são afastamentos totais de Serviço, anual e obrigatoriamente concedidos aos bombeiros-militares para descanso.

[…]

§ 5º – Na impossibilidade de gozo de férias no ano seguinte pelos motivos previstos no parágrafo anterior, ressalvados os casos de transgressão disciplinar de natureza grave, o período de férias não gozado será computado dia-a-dia, pelo dobro, no momento da passagem do bombeiro-militar para a inatividade e, nesta situação, para todos os efeitos legais.

Art. 62 – A licença especial é a autorização para o afastamento total do serviço, relativa a cada decênio de tempo de efetivo serviço prestado na Corporação, concedida ao bombeiro-militar que a requeira, sem que implique qualquer restrição para a sua carreira.

[…]

§ 3º – Os períodos de licença especial não gozados pelo bombeiro-militar são computados em dobro para fins exclusivos de contagem de tempo para a passagem à inatividade e, nesta situação, para todos os efeitos legais.

Estatuto da Policia Militar

Art. 64 – Licença é a autorização para o afastamento total do serviço, em caráter temporário, concedida ao policial-militar, obedecidas as disposições legais e regulamentares.

Art. 65 – A licença especial é a autorização para afastamento total do serviço, relativa a cada decênio de tempo de efetivo serviço prestado, concedida ao policial-militar que a requeira, sem que implique em qualquer restrição para a sua carreira.§ 1º – A licença especial tem a duração de 6 (seis) meses, a ser gozada de uma só vez, podendo ser parcelada em 2 (dois) ou 3 (três) meses, quando solicitado pelo interessado e julgado conveniente pelo Comandante Geral da Corporação.§ 2º – O período de licença especial não interrompe a contagem de tempo de efetivo serviço.§ 3º – Os períodos de licença especial não gozados pelo policial-militar são computados em dobro para fins exclusivos de contagem de tempo para a passagem para a inatividade e, nesta situação, para todos os efeitos legais.

Note-se que apesar de não haver mais a previsão legal do artigo 77, inciso XVII, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que assegura ao servidor a conversão em pecúnia das férias não gozadas ( julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 227), o próprio STF entendeu que a conversão é possível bastando que o servidor esteja na inatividade.

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Em sua manifestação, ministro Gilmar Mendes, no julgamento do ARE 721001/RG ( onde foi firmada a Tese n° 635), registrou a inaplicabilidade da ADI 227 ao caso, tendo em vista que a inconstitucionalidade declarada na ação direta referia-se ao artigo 77, XVII, da Constituição Estadual do Rio de Janeiro, dispositivo que atribuía ao servidor público a faculdade de optar pelo gozo das férias ou por sua transformação em pecúnia indenizatória, “deixando ao seu arbítrio a criação de despesa para o erário”. “No caso dos autos, diferentemente, o acórdão recorrido assegurou ao servidor público a conversão de férias não gozadas em pecúnia, em razão da vedação ao locupletamento ilícito por parte da Administração, uma vez que as férias devidas não foram gozadas no momento oportuno, quando o servidor ainda se encontrava em atividade”, ressaltou.

Conforme o ministro Gilmar Mendes, “com o advento da inatividade, há que se assegurar a conversão em pecúnia de férias ou de quaisquer outros direitos de natureza remuneratório, entre eles a licença-prêmio não gozada, em face da vedação ao enriquecimento sem causa”. Ele salientou que esta fundamentação adotada está amparada por jurisprudência pacífica do Supremo, que se firmou no sentido de que é assegurada ao servidor público a conversão de férias não usufruídas ou de outros direitos de natureza remuneratória em indenização pecuniária, dada a responsabilidade objetiva da Administração Pública em virtude da vedação ao enriquecimento sem causa.

Porém, é condição à conversão em pecúnia de licenças-prêmios ou férias não gozadas que não tenham sido contadas em dobro para fins de aposentadoria. Neste sentido, leia-se:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. TERMO INICIAL. DATA DA APOSENTADORIA. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou-se no sentido de que o termo inicial da contagem do prazo para requerer indenização por licença-prêmio não gozada e não contada em dobro é a data da passagem do servidor para a inatividade. 2. Agravo Regimental não provido.” Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA.

Todavia, a jurisprudência admite, mesmo quando contado em dobro o benefício, sua em pecúnia quando, afinal, não tenha influenciado para a passagem à inatividade do servidor. A propósito, veja-se:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MILITAR INATIVO. LICENÇA ESPECIAL NÃO USUFRUÍDA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. SÚMULA 7 DO STJ. NÃO INCIDÊNCIA. 1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo n. 2). 2. Segundo o entendimento desta Corte, é devida ao militar a conversão da licença especial em pecúnia, desde que esse período ficto, embora computado para fins de aposentadoria, não tenha influenciado para a concessão desse direito, por possuir tempo de serviço em excesso, devendo, nesse caso, ser excluída a averbação do período decorrente da contagem em dobro e compensados os valores indenizatórios com o quanto pago a título de adicional de tempo de serviço usufruído em decorrência dessa contagem ficta. Precedentes. 3. Tendo o Tribunal a quo afirmado que, para efeitos de direito à reserva remunerada, o cômputo em dobro das licenças não gozadas como tempo de serviço em nada beneficiou o autor, sem razão a alegação da agravante de que haveria de incidir a Súmula 7 do STJ sobre a pretensão recursal. 4. Agravo interno desprovido.” (Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA).

Dessa forma, há que se ter em mente que a conversão será sempre possível quando a licença prêmio e féria não forem gozadas quando no serviço ativo e ainda quando os períodos de licença a prêmio e férias não gozadas não tenham sido utilizados como tempo fictício contados em dobro para a passagem a reserva remunerada.

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Assim, fora essas exceções, entendem os tribunais que, mesmo que haja contagem em dobro das licenças prêmio e férias não gozadas, contanto que as mesmas não impactem no recebimento de gratificações de tempo de serviço ( Triênio) e na percepção do Adicional de Inatividade. Vejamos:

Adicional de Inatividade(Art. 5, da Lei 658/2013):

Art. 5º – A Indenização Adicional de Inatividade será calculada, mensalmente, sobre os respectivos proventos, nas seguintes condições:
I – 30% (trinta por cento), quando o tempo computado, para todos os efeitos legais, for de 40 (quarenta) anos;
II – 25% (vinte e cinco por cento), quando o tempo computado, para todos os efeitos legais, for de 30 (trinta) anos;
III – 20% (vinte por cento), quando o tempo computado, para todos os efeitos legais, for inferior a 30 (trinta) anos.

Gratificação de Tempo de Serviço ( Art. 16 e 17 da Lei 279/1979)

Art. 16 – A gratificação de tempo de serviço é devida por triênio de tempo de efetivo serviço prestado.
Art. 17 – Ao completar cada triênio de tempo efetivo de serviço, o PM ou BM perceberá a Gratificação de Tempo de Serviço, cujo valor será para o 1º triênio de 10% (dez por cento ) e os demais de 5% (cinco por cento), calculados sobre o soldo de posto ou graduação, limitada a vantagem a 9 (nove) triênios.

Portanto, o militar atinge o máximo de sua Gratificação por Tempo de Serviço com 33 anos de serviço computados.

Assim , caso tenha havido contagem em dobro, como tempo fictício, das licenças prêmio e férias não gozadas, se as mesmas não impactarem na contagem de um desses benefícios, será possível também a conversão.

Por exemplo, militar vai para reserva com 32 anos de serviço ( somados em tese serviço público e INSS se for o caso) e não gozou suas 3 licenças prêmio que fazia jus. Considerando que utilize uma das licenças prêmio para chegar aos 33 anos para atingir o limite de 60% de sua Gratificação por Tempo de Serviço, os demais períodos de licença a prêmio poderão ser convertidos mesmo que tenham sido contados em dobro pois não impactarão nem no Adicional de Inatividade, nem na Gratificação por Tempo de Serviço.

Se por exemplo, o militar , ao passar a reserva remunerada, somava 38 anos de serviço ( somados em tese serviço público e INSS se for o caso) e não gozou da mesma forma 3 períodos de licença prêmio. Assim, para atingir o máximo de 60% de Gratificação por Tempo de Serviço não necessita utilizar o período de licença prêmio contado em dobro. Todavia, para atingir a percentagem máxima de adicional de inatividade (30% – art.5°, inciso I da Lei 658/2013) terá de atingir 40 anos. Necessitará, portanto, de utilizar dois períodos de licença prêmio para atingir essa percentagem de Adicional de Inatividade. Entretanto, sobraria ao mesmo um período de licença prêmio que, mesmo contado em dobro, poderá ser convertido pois a contagem em dobro desse período restante não lhe beneficiará em mais nenhum benefício.

Por fim, o valor a receber deverá ser com base no último vencimento de ativo, descontada apenas as verbas transitórias, como, por exemplo, o auxílio moradia.

JOSE RONALDO DOS REIS

ADVOGADO OABRJ 200.073


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